quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Vazio.



Ela estava completamente nua e sentia frio. Suas lágrimas escorriam por seu rosto e caíam naquele chão de barro. Ela estava tão acostumada com a escuridão, que as sombras do ambiente já lhe eram amigáveis. Toda noite ela deitava, depois de ser abusada e cortada, perto de uma pequena poça de água e chorava até dormir. Sua pele coberta de sangue já não era a mesma de três anos atrás, não havia mais bochechas rosadas, apenas profundas olheiras, era praticamente osso e carne.
Ela não sabia o que havia feito, não entendia como estava ali. Mais uma vez eles entraram, dessa vez não levaram pedaços de sua pele, arrancaram seus olhos e a jogaram lá novamente, ela sentia tanta dor que não conseguia pensar, uma dor tão intensa que a fez apagar. Acordou envolta em uma neblina, sua pele estava fantasmagoricamente branca, seus olhos viam tudo mais nítido, mais colorido e mais... sinistro.
Ela relembrou de tudo e ficou em choque, como poderia enxergar sendo que não tinha mais olhos? Viu que havia um espelho perto e deu um grito ao ver que no lugar de seus olhos, havia dois grandes buracos. Ela não tinha olhos. Acordou do choque e não enxergou nada, só sentia a dor e o sangue escorrendo pelo buraco de seus antigos olhos... Deitou e esperou, ela não demorou chegar, deu um beijo em seu rosto e a levou consigo, levou pra longe dos olhos famintos.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Cristália

Ametista caminhava por aquela caverna havia tempo demais, não conseguia encontrar a saída e nem o fim da escuridão. Suas roupas roxas emitiam uma breve e vacilante luz que a ajudava a andar por ali. Lá ela conheceu o senhor Cristal, tão antigo e preso ali há mais tempo que ela. Tropeçou em cima da madame Diamante, uma peça rara daquela escuridão. Cruzou olhares com o conde Citrino, rico e fino que ele só. Depois de tantos encontros e desencontros ela viu uma luz vindo do alto e um pedaço de metal arrancar-lhe da escuridão, foi torturada, quebrada e lapidada, prendeu-se em um pingente, junto com a Prata, uma metida que ela não suportava. Da escuridão pra ficar no coração de uma efêmera mortal.
-Mas meu senhor, não está com calor?
-O unico calor que sinto é de meu amor
-Mas e sua saúde, dizem que seu coração só tem rancor
-Eu já passei da fase da dor
-Mas é um caos esse seu ardor
-Caos é sua ignorância sem pudor
-Não seja tão bravo, senhor
-Não seja tão ouvinte alheio, pastor
-Ok, fique com seu calor do ardor
-Eu ficarei com a cor do amor.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Lixo aéreo

Um ponto no meio de tudo. Uma mísera alma na multidão destruidora. Eles podem sentir você caminhando no ar e podem fazer você achar que é completo. Eles que não são nem luz e nem sombras, que vivem pra isso, pra pequenos prazeres efêmeros e vazios de sentimentos. No gole da primeira cerveja, na risada de uma piada sem graça, em beijos de dúzias de pessoas que já beijaram outras dúzias de pessoas naquela noite. Nem todos os veem, nem todos os sentem, mas eles interferem em todos. Não é só porque não os vê que não possa existir. Eles não estão em um beijo apaixonado, ou no choro de despedida. Eles não aparecem quando você termina um projeto novo, quando faz uma viagem pra relaxar. O que você faz é o que você atrai.

Gaia

Ela entrou em seu quarto quase que em transe, trancou a porta e suspirou fundo. Lentamente suas roupas foram caindo, seu corpo foi ficando leve, quase como se fosse feita de neblina, sua respiração era quase imperceptível. Seus passos, mais silenciosos que os dos gatos, saltitavam pelo quarto em espirais unidas ao corpo. Ela dançava lentamente, com sorrisos e olhadas pro nada.
O nada que ela olhava era tudo que a completava.
Observei-a durante muito tempo, pura felicidade irradiada na forma de dança, leve e intensa, firme e flexível. Quantas risadas, quanta música e quanta pureza. Ela não dançava sozinha, ela dançava com as batidas da Terra.

Tintura

Seu corpo tremia de excitação e medo. Poderiam ser pegos, vidas em risco? Não, apenas memórias em risco. Arriscar um futuro incerto do que um presente petrificado é algo tolo e perigoso. Mas eles eram, queriam e desejavam. Saíram do cinza e foram pro colorido. Confusão, cores, misturas, dores, dramas, felicidades, músicas que te expressam. O colorido era demais, as cores eram demais, deitaram-se e fizeram a cor da vida escorrer, pularam pelos corredores e chegaram tarde demais. Cores de rio vermelho sangue corriam por seus pulsos.